26/05/23

Bardo VIII : Vida

 

Vida
( Harmonia )


Um golpe duro de fouce
mutilara-lhe a juventude,
segara-lhe a alegria.

Passam os anos,
enruga-se a pel,
repousa a mirada,
minguam as forças.

Contra uma pena espotreada
sua alma errante, moribunda,
arrincou em mil anacos
o pesar que a consumia.

Alá quedam seus queixumes,
suas dores, seus pesares
e uma moi pessada losa
de moi fondo sofrimento.

Sua séria solenidade,
esperando o acontecemento,
enchia-a de dignidade
cum orgulho contido.

Um delicado cheiro
chegava-lhe co morno vento.
Num sonho longo dum dia
ía passando-lhe a vida.

Uma noite de amargura,
umas horas de dor,
um desatino, um tropeço,
levou-na ao seu destino.

Apareceu bulindo a morte,
fendendo-lhe os sonhos,
fenecendo-lhe impolutos,
num calado e frio adeus.

Seu agónico sorriso
despedindo-se de nós,
mudou pesar em alegria
ao rematar sua jornada.

No cabo do caminho
é a alegria da chegada.
No cabo do caminho
está o fim das nossas dores.

Ogalhá sonhes comigo
coma eu sonho convosco,
para poder crer que vivo
mergulhado no teu Mundo.



A Maria Armonia in memoriam, barda de Santomé



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08/04/23

Pregom 114 : Vidas paralelas

 

Vidas paralelas


Mulher misteriosa
caminha gabacha,
siguindo meus passos
pola rua do passeio.

Coa azul alegria
da tarde de Maio,
caminho da alameda.

Na mirada leva,
da mar calma o sossego
e a paz duma pomba.

Duas vidas paralelas
em mundos disjuntos,
num jardim partilhado.




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07/02/23

Pregom 113 : Merecer o ceo


 
Merecer o ceo


Os atos sejam sobrados
e os gestos generosos,
caminhar co peito erguido,
sendo desinteressado.

As faturas todas pagas
e os pecados perdoados,
é o que um mais quigera
para merecer o ceo.

Nom lhe chamo cobardia
ao pecar de ser prudente,
nim chamarei-lhe insubmisom
ao espírito indomável.

Nom lhe chamarei violéncia
defender com paz sem fúria
as causas que sejas justas,
loitando por um ideal.




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28/01/23

Pregom 112 : Porta misteriosa

 

Porta misteriosa


A boca da Pedra Furada
é uma porta misteriosa.

Sintem-se passos de pantasmas,
muitos silenciosos passos.
Luzes, sombras, escuredade,
nascementos, vida e morte.

Raízes desesperadas
turrando pola sua vida,
apertando-se a uma peneda,
esparegendo suas rugas.

Vim mover-se à pedra
diante mesmo de mim 
e morder na terra,
num monte churido de carqueixas.

Terra, fábrica de espíritos puros;
almas que viajaram eternamente
polo Universo infinito.

E muitas cousas veredes :
Correntes de auga cara riba,
árvores de lume perpétuo,
meninhos com ás,
almas pelegrinas buscando albergue.

Sentado en riba da Pedra Furada
o meu Mundo gira arredor de mim,
como um alógrove,
levado pola inércia
do seu espírito
e sua consciéncia cósmica.

Cantava um ruixinol
cum trino de poesia
e na voz dum meninho
escuitava-se a inocéncia.




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27/01/23

Pregom 111 : Alta tensom

 
Alta tensom


Sentia a moléstia
dum lixo num olho.
Era sua preséncia
uma pele de noz
apegada no ceo da boca.

Uma semente de figo
entros dentes atrapada.
O espinho duma silva
na iema dum dedo.

Quando enfurrunhava
era picada de vespa
no médio do calcanhar.
Sacudidura de tabao.




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